A redenção do mago e ocultista Aleister Crowley
O
filme, mais uma "biografia definitiva" (que saiu em setembro no
exterior), um punhado de livros sobre sua "magia sexual" e seu tarô
(lançados pela Madras, editora brasileira de obras maçônicas e
holísticas) e até uma campanha fake à presidência dos EUA cuidam de
reacender a chama de Crowley — e, também, de enfim redimi-lo.
Jogado
ao ostracismo no fim da vida, Aleister Crowley voltou pela porta dos
fundos da cultura pop. Ao lado de Albert Einstein e Marilyn Monroe, ele é
uma das celebridades cujas fotos figuram na capa de "Sgt. Pepper’s
Lonely Hearts Club Band", clássico disco dos Beatles de 1967. Pouco mais
tarde, Jimmy Page, guitarrista do Led Zeppelin, tornou-se um dos
maiores propagandistas de Crowley — para ele, um libertário e "gênio
incompreendido".
O filme "O início, o fim e o meio" lembra o tempo
em que as ideias do inglês chegaram a um jovem brasileiro interessado
em magia e ocultismo: Paulo Coelho, que apresentou Crowley a seu
parceiro, o roqueiro Raul Seixas. Sob sua inspiração, os dois compuseram
a canção "Sociedade Alternativa" e planejaram torná-la uma realidade.
Paulo, que chegou a se filiar à Ordo Templi Orientis (O.T.O., ordem
mística da qual o mago britânico foi um dos líderes), largou tudo depois
de um suposto encontro com o Demônio e de sua subsequente prisão pela
polícia da ditadura militar — episódio contado com detalhes na biografia
"O mago", do jornalista Fernando Morais.
"Esse foi um período
negro na minha vida, a magia fora de qualquer ética, todos pagaram o
preço", conta Paulo Coelho no filme, que também deu voz ao mestre do
escritor na O.T.O., Euclydes Lacerda (falecido no ano passado, de
câncer). Ele diz no depoimento que o escritor (parceiro de Raul no "Rock
do diabo") pode até ter renegado a Ordem, mas continua a ela filiado,
já que o desligamento teria que ser feito por escrito.
O escritor
inglês Tobias Churton, autor de "Aleister Crowley — The biography" (a
"biografia definitiva") conta que uma das ideias mais erradas acerca do
seu biografado é a de que ele seria um satanista, adepto da magia negra.
—
Crowley não adorava aquilo em que não acreditava. E ele não acreditava
na figura que a Igreja define como "Satã". Ele dizia que Diabo é o nome
dado a qualquer deus de que o crente desgoste ou tenha medo. Ele se
interessava bastante pelo processo histórico segundo o qual as
autoridades religiosas puseram a realização sexual na esfera do diabo —
e, com o sexo, também as mulheres. As crenças de Crowley eram positivas,
libertadoras. E espirituais — diz.
Músico e escritor, tradutor e
autor de "Aleister Crowley, a biografia de um mago" (lançado no ano
passado pela Madras), o brasileiro Johann Heyss lembra que a imagem de
satanista permanece, em muito por causa da cultura pop — há que se
lembrar da canção "Mr. Crowley", um dos grandes sucessos de Ozzy
Osbourne, em que ele canta: "Você enganou a todos com mágica/ Você
esperou o chamado de Satã."
— Essa é uma canção bastante crítica.
Mas eu também não sei se, nas condições em que Ozzy estava quando a fez
(início dos anos 1980, auge de seu vício em drogas e álcool), ele tinha
como criticar alguém — diz Johann, que lembra a ligação de Crowley com
alguns dos maiores intelectuais do século, como o poeta português
Fernando Pessoa, admirador com quem ele chegou a se encontrar em
Cascais, nos anos 1930.
Aleister Crowley que emerge da biografia
de Tobias Churton é uma figura complexa. Um britânico de família
aristocrática que correu o mundo atrás de conhecimento espiritual e que
se rebelou contra o Cristianismo. Um amante insaciável, que buscou a
união entre sexo e misticismo. Um viciado que passou maus bocados com a
heroína, mas que tinha um irresistível carisma — um talento para o
relacionamento social que ele usou, segundo revela o livro, como espião
nas duas grandes guerras.
— Aleister Crowley merece atenção em
parte porque estava muito à frente do seu tempo (e do nosso também) e
porque tem muito a dizer sobre humanidade. Ele pode ser apreciado como
escritor, artista e ensaísta, como guia espiritual e como aventureiro.
Ele reviveu algo cujas raízes são muito antigas e deu uma forma com a
qual podemos trabalhar .
Fartura editorial
Uma
prova dessa amplitude do legado de Crowley é dada pela Madras Editora,
de São Paulo ("Somos os únicos que editam as suas obras no Brasil",
informa o editor Wagner Veneziani Costa). Por ela, saíram, nos últimos
dois anos, desde a a biografia escrita por Johann Heyss até livros como
"Tarô de Crowley", "Aleister Crowley e o tabuleiro Ouija", "A Goetia
ilustrada de Aleister Crowley — Evocação sexual" e "Os livros de
Thelema".
Estudante de Física, o americano Joseph Thiebes foi além
e lançou a "campanha" de Aleister Crowley para a presidência dos
Estados Unidos em 2012 (http://ac2012.com/) com o lema "fazer o que tu
queres será o todo da Lei".
— Essa é a mensagem que eu espero que
um dia todos os políticos conheçam. E outro dos objetivos dessa campanha
é dissipar muitas das calúnias e dos mitos sobre ele perpetuados pela
imprensa sensacionalista — conta Joseph, que publicou no site um texto
sobre a Sociedade Alternativa de Raul Seixas e Paulo Coelho.
— É
uma pena o que aconteceu com o Paulo (que abandonou as ideias de
Crowley), mas é compreensível que, depois de ter sido preso e punido por
suas crenças, ele tenha mudado seu ponto de vista. Gosto dos seus
livros e desejo o melhor para ele — diz Joseph.ADAPTADO//MAGNOPOLÊMICO//
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