domingo, 12 de fevereiro de 2017

ARTIGO DEDOMINGO: BELO MONTE SERÁ CHINESA?

ARTIGO DEDOMINGO: BELO MONTE SERÁ CHINESA?



- por Lúcio Flávio Pinto (*)

O Estado de S. Paulo anunciou, anteontem, que o controle acionário da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, está à venda. O jornal obteve informações de que os principais acionistas da Norte Energia, concessionária que administra a usina, já contrataram o Bradesco BBI e buscam com um banco internacional para buscar potenciais investidores no Brasil e no exterior.
A oferta de venda seria das ações da estatal mineira Cemig, da Light,,  dos fundos de pensão Petros (da Petrobrás) e Funcef (da Caixa), da mineradora Vale, da siderúrgica Sinobras, de Marabá,  e da J. Malucelli. Em conjunto, elas detêm 50,02% da Norte Energia.
Segundo o jornal paulista, o valor patrimonial de Belo Monte, projetada para ser a terceira maior hidrelétrica em capacidade instalada do mundo, é estimado em 10 bilhões de reais. A conclusão das obras será em 2019, quando todas as suas 18 turbinas gigantescas estarão funcionando, em condições de gerar (no auge do período de chuvas) 11.233 megawatts (MW) de energia. Essa etapa ainda exigirá mais R$ 5 bilhões, pelo menos.
O jornal diz que nessa etapa final, o custo de Belo Monte será de mais de R$ 31 bilhões, a partir de uma previsão inicial de R$ 18 bilhões. Desse total, R$ 22 bilhões foram financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, do qual a Norte Energia ainda espera receber mais R$ 2 bilhões. O eventual comprador assumirá desse débito.
Segundo a notícia, “por ora, a participação do Grupo Eletrobrás, de 49,98%, não está à venda. Mas, como a estatal tem o direito de “tag along” (mecanismo que permite ao minoritário vender suas ações pelo preço pago ao controlador), o grupo também poderia vender sua fatia na hidrelétrica, diz uma fonte do setor, caso o valor seja satisfatório”.
Informa o Estadão que “antes mesmo da contratação do banco que vai liderar a negociação, algumas chinesas – que são consideradas “candidatas” a qualquer processo de fusão e aquisição no País – já vinham sondando o empreendimento. State Grid e China Three Gorges – que estão há mais tempo no Brasil e abocanharam importantes ativos no setor de energia, como Cesp, CPFL e Duke Energy – já começaram a avaliar a usina. A State Grid, por exemplo, está construindo o linhão que vai distribuir a energia de Belo Monte”.
A previsão dos informantes é de que venha a ser formado um ou mais consórcios, indicando que a disputa no leilão será acirrada, apesar de um complicador: os investigadores da Operação Lava Jato receberam informações sobre o pagamento de propina a políticos por parte do consórcio construtor de Belo Monte, formado pelas empreiteiras Odebrecht, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, OAS e outras cinco empresas menores, também participantes do esquema de corrupção na Petrobrás.
“Há uma enorme preocupação por parte dos investidores que têm negociado ativos de empresas envolvidas na Lava Jato de que o escândalo acabe respingando nos futuros controladores. Se o valor da multa já está estipulado, coloca-se no preço. Caso contrário, a incerteza é grande”, disse ao jornal um advogado, que preferiu não se identificar.
Outro entrave por ele apontado “é o modelo financeiro adotado em Belo Monte. Analistas que acompanham o projeto afirmam que o retorno do investimento caiu pela metade nos últimos anos por causa das paralisações e multas aplicadas por atraso nas obras”.
Embora algumas informações citadas no texto não estejam corretas, a transferência do controle acionário de Belo Monte dá razão aos raros que apontavam a inviabilidade econômica do empreendimento. A elevação exagerada do seu custo final, por diversos fatores, complicou o retorno do investimento através da receita operacional. A usina teria que funcionar por bastante tempo com prejuízo. As empresas dispostas a passar em frente as suas ações não querem ou não podem suportar esse ônus.
Um novo controlador o assumirá? Os chineses, talvez. Pela regra das suas negociações, porém, desde que haja compensações e vantagens tanto no negócio de energia quanto nos interesses paralelos ou convergentes que possuem ou pensam ter. Caso a transação ocorra, eles se tornarão donos tanto da geração da maior hidrelétrica do Brasil quanto das linhas de transmissão de energia.
Não é, portanto, apenas uma operação comercial. Toca em interesses superiores do país. Por isso, tem que ser acompanhada pela sociedade.


- (*) Lúcio Flávio Pinto é jornalista profissional desde 1966. Percorreu as redações de algumas das principais publicações da imprensa brasileira. Durante 18 anos foi repórter em O Estado de S. Paulo. Em 1988 deixou a grande imprensa. Dedicou-se ao Jornal Pessoal, newsletter quinzenal que escreve sozinho desde 1987, baseada em Belém.
No jornalismo, recebeu quatro prêmios Esso e dois Fenaj, da Federação Nacional dos Jornalistas. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace e, em 2005, o prêmio anual do CPJ (Comittee for Jornalists Protection), de Nova York.

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