sábado, 2 de março de 2013

A intimidade do ditador Joseph Stálin


Sessenta anos depois da morte do ditador Joseph Stálin, um novo livro revela detalhes de sua vida pessoal.

PAI COREUJA Stálin com sua filha, Svetlana, em 1936.  O líder da União Soviética a chamava de “Chefinha” e “Pardalzinho” (Foto: AP) 

Em 1935, numa de suas raras visitas à mãe, o tirano soviético Joseph Stálin (1879-1953) se viu diante de um desafio inusitado: explicar qual era, exatamente, sua profissão. “Mamãe, lembra-se do nosso czar? Pois bem! De certa forma, sou o novo czar”, disse ele. Ela não ficou satisfeita: “Pondo tudo na balança, você teria feito melhor virando padre”.

Episódios como esse, narrados no livro A vida privada de Stálin (Zahar, 256 páginas, R$ 54,90), apresentam uma faceta pouco conhecida de um homem que a história eternizou como ditador sanguinário, responsável pela morte de milhões de pessoas nos 30 anos em que esteve no poder. Escrito pela pesquisadora francesa Lilly Marcou, especialista em história do comunismo, o livro reúne documentos pessoais de Stálin e seus descendentes para decifrar a intimidade do personagem. O resultado é uma figura contraditória. Impiedoso e gélido com aqueles que julgava adversários, Stálin jamais deixou de desejar “mil anos de vida” a sua “mamãe”. Constantemente lamentava não ter tempo suficiente para ver seu “Pardalzinho”, a filha Svetlana Alliluyeva. “Ele era uma pessoa terrivelmente contraditória”, afirma Lilly.

As raízes dessa contradição estão, segundo ela, no contraste entre a infância humilde de Stálin e o poder que ele adquiriu ao longo da vida. Stálin nasceu no pequeno vilarejo de Gori, na Geórgia, num ambiente de extrema pobreza. Sua mãe era faxineira e ama de leite na casa de um aristocrata. Seu pai era um homem violento, que agredia mãe e filho. Bom aluno nos colégios locais, conseguiu entrar num seminário, mas não realizou o sonho materno de ter um filho padre. Revoltava-se contra a disciplina imposta pelos padres e articulava motins com seus colegas. Tornou-se revolucionário na adolescência. Aos 26 anos, casou-se com Ekaterina Svanidze, uma mulher submissa e religiosa. Amava-a tanto que aceitou casar-se numa igreja, contrariando a ideologia comunista. Teve com ela apenas um filho, Iakov, que morreu anos depois num campo de concentração nazista. Após a morte da mulher, em 1907, casou-se novamente, com Nadejda Alliluyeva, 20 anos mais jovem que ele e filha de militantes bolcheviques. Com ela, teve dois filhos: Vassili e Svetlana, sua preferida.
PEREGRINAÇÃO Centenas de russos reunidos para visitar o túmulo de Stálin em 2010. O genocídio cometido por seu governo não extinguiu o culto a sua imagem (Foto: Misha Japaridze/AP)

 

A atenção dada pela história ao temperamento de Stálin e à influência da vida pessoal em suas decisões diminuiu gradualmente a partir do governo de seu sucessor, Nikita Kruschov. Ele foi o primeiro a acusar Stálin de genocídio. As revelações de Kruschov sobre Stálin foram parte de um esforço do Partido Comunista para anular o culto à personalidade do ditador. Durante seu governo, Stálin foi um ídolo popular, cuja imagem paternal era construída pela máquina de propaganda do partido. Ela alimentava o fanatismo. Na Segunda Guerra Mundial, quando Moscou estava ameaçada pelas tropas alemãs, Stálin circulou pelas ruas da cidade num carro conversível, e os jornais fizeram a imagem circular pelo país inteiro. A euforia causada por sua presença no metrô de Moscou com a família, em 1932, provocou tumultos e morte. O fervor stalinista sobreviveu à revelação das barbáries praticadas em seu governo. Depois de 1953, seu jazigo no Kremlin tornou-se um ponto de peregrinação de comunistas. Em 2008, ele foi eleito pelos telespectadores da rede de televisão russa VID o terceiro maior russo de todos os tempos – apesar de ter nascido na Geórgia.
Outra historiadora, Nina Kruscheva, professora de relações internacionais do New School College de Nova York e bisneta de Nikita Kruschov, o sucessor de Stálin, discorda da tese de Lilly de que Stálin tenha sido uma figura ambígua. “O fato de ter sido um ditador desqualifica as coisas boas que ele tenha feito”, disse ela a ÉPOCA. Sua própria família chegou à mesma conclusão. Em 1967, sua filha, Svetlana, o Pardalzinho, pediu asilo político aos Estados Unidos e denunciou os crimes cometidos pelo pai. Os mimos de Stálin a sua filha favorita não foram suficientes para comprar sua lealdade no longo prazo.  
magnopolêmico//fonteG1

Nenhum comentário:

Postar um comentário